terça-feira, 7 de agosto de 2012

Sobre uma época que usei um vestido bege ou xadrez



 Entrou assim, pedindo licença, sem esperar resposta.
Entrou e sentou no canto do sofá,
o sapato em cima do tapete, tapete um pouco empoeirado.

Ofereci um café,
aceitou.

Ofereci uma longa e detalhada narração sobre a vida,
ouviu e foi se aconchegando.

Perguntou  sobre o porquê de uma lágrima encontrada abaixo do lustre, expliquei ter sido  o vento o responsável por dissolver certos pesares.

A tarde caía e assistimos a um filme antigo, parecia novo e era um dos nossos favoritos.
Tal como a neve, sempre retornávamos serenos à superfície do cerne.

Pensei por um tempo, o silencio reluzia, por ora feliz.
Pensou por um tempo, o silencio ancorava, mais uma vez reles.

Revelei algo meio óbvio, sorriu e levantou os olhos.

Olhou e decorou cada sorriso,
aos poucos deve ter ansiado pelos risos e olhares também.

Caminhou pelo apartamento delicadamente,
como se tudo fosse de papel ou areia.

Caminhei pelos cômodos lentamente,
como se tudo fosse uma fotografia ou uma pintura.

Pusemo-nos um ao lado do outro e demos as mãos,
não houve promessas nem declarações.

Fitei o céu, o sol.
Observou as nuvens, o céu.

A vitrola lançava-me uma benção,
a máquina de escrever lampejava qualquer descontentamento.

Foi até a cozinha e acendeu um cigarro.
Fui à sacada e bebi outro gole de água.

Fui à cozinha e joguei migalhas fora.
Foi à sacada e desligou o mundo.

Dormiu em mim.
Dormi sem roupa.

Dancei um blues.
Dançou um blues.

Contou-me seus medos e sonhos,
ouvi e sorrateiramente fiz sentido.

Como era de se esperar,
outro acaso bateu na janela.

Como qualquer um imaginaria,
o destino gostou do caminho e repousou sobre ele.

Descobriu-me dum fevereiro desses.
Descobri-o duma noite qualquer.

Enfim saiu, pedindo licença, esperando resposta.

Saiu assim, pela porta da frente, agradecendo o café.
Foi embora, mas ficou.

Olhei para dentro e não restava muito.
Entrei para fora, eu precisava de um emprego, nada mais por agora.

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